> > MIURA

MIURA | galeria

Marca dos automóveis esportivos construídos em Porto Alegre (RS) pela empresa Besson, Gobbi & Cia. Ltda., um dos mais férteis e criativos fabricantes de carros de pequena série já surgidos no Brasil. O primeiro automóvel da longa série que levou o nome Miura foi lançado em 1976, no X Salão do Automóvel. Era objetivo da empresa dispor de um produto exclusivo para ser distribuído pela Aldo Auto Capas, rede comercial criada em 1966 e pertencente ao grupo, dedicada à produção e venda de bancos, rodas e acessórios para automóveis. O novo carro utilizava plataforma do Volkswagen Brasília, sem cortes ou alterações mecânicas. A baixíssima carroceria em cunha (1,14 m), livremente inspirada no Lamborghini Urraco, foi desenhada pelo projetista Nilo Laschuk, então ainda estudante de arquitetura em Caxias do Sul (RS).

Desde o primeiro modelo o Miura trouxe soluções técnicas e estéticas modernas e originais, algumas delas só começando a ser difundidas nas décadas seguintes: faróis (retangulares) encobertos por tampas escamoteáveis, com abertura a vácuo ao acenderem-se as luzes; limpadores de para-brisa escondidos sob o capô quando recolhidos; para-choques resumidos a grossas barras de plástico injetado; vidro plano com extremidade curva na grande vigia traseira, acompanhando o perfil da carroceria e favorecendo a visibilidade; tampa do motor sustentada por amortecedores a gás; pedais reguláveis em distância; volante com regulagem elétrica de altura; painel de instrumentos com console central e três módulos voltados para o motorista; bancos reclináveis com apoio para a cabeça. O tanque de combustível, posicionado entre o motor e a cabine, permitiu criar um bom porta-bagagens na dianteira. A produção foi iniciada com 25 unidades mensais; a empresa pretendia chegar ao final de 1977 com cem por mês, o que não chegaria a acontecer, apesar do sucesso que o carro encontrou.

O Miura era bem acabado e tinha bom espaço interno, mas o fabricante resolveu alterá-lo para 1979, elevando o teto em três centímetros e substituindo o painel modular por um de desenho mais convencional; o interior foi revestido de couro. Apresentado no XI Salão, o modelo ficou conhecido como Miura II. No evento também foi apresentado um protótipo do modelo equipado com motor Passat TS. Concebido para compensar o baixo desempenho do motor refrigerado a ar, o protótipo seria lançado no ano seguinte como Miura MTS. A menos do motor mais moderno refrigerado a água, com quatro cilindros em linha e 96 cv montado na traseira, toda mecânica restante era originária do Brasília (plataforma, suspensões, freios e direção). A carroceria de fibra foi aliviada em peso e, ainda que mantendo o perfil em cunha, foi bastante alterada, especialmente na traseira, que recebeu novo lay-out e teve eliminada a grande porta envidraçada, substituída por vigia fixa com vidro plano e uma tampa de acesso ao motor com grelhas de ventilação. O carro ganhou grade na dianteira (atrás da qual ficava o radiador de água), lanternas avançando pelas laterais, discreto spoiler, janelas traseiras maiores, ponteiras nos para-choques e retrovisores com regulagem elétrica. O painel de instrumentos foi elevado 5 cm para aumentar o espaço para as pernas. Os dois modelos Miura se constituíram em efetivo sucesso de mercado, com quase mil unidades fabricadas em quatro anos (600 somente em 1980), muitas delas exportadas para a América Latina, mas também para Portugal e Kuwait.

Em 1981 os dois modelos passaram a ser oferecidos em versão a álcool. No XII Salão, em novembro, foi apresentado um carro totalmente novo, o Miura Targa, 2+2 com teto rígido removível de fibra de vidro. Primeiro modelo com motor dianteiro da marca, substituiu a mecânica Brasília pela do Passat GTS. Montado sobre um chassi tubular perimetral projetado pela própria empresa, tinha tração dianteira, motor 1.6 a gasolina (76 cv) ou 1.5 a álcool (65 cv), suspensão McPherson na frente, braços oscilantes com molas helicoidais atrás e freios a disco nas rodas dianteiras. Sofisticado, o Targa trouxe trava e vidros elétricos, encosto dos bancos com regulagem contínua, estofamento de couro ventilado, vidros verdes, para-brisa laminado degradê e computador de bordo com onze funções.

miura-texto2

O primeiro GT Miura, inesperadamente fotografado em 2010 em Barranquilla, Colômbia (fonte: site automovilescolombia).

Também o Miura MTS foi modificado: o teto foi mais uma vez elevado (4 cm), melhorando o espaço interno e ampliando a área das janelas, as tampas de recobrimento dos faróis aumentaram de tamanho, as ponteiras dos para-choques avançaram até os arcos das rodas e as quatro lanternas ganharam novo desenho, as da frente não mais chegando às laterais; o carro recebeu pedais suspensos e freios a disco nas quatro rodas. Enquanto isso a empresa continuava a investir nas exportações, em 1982 enviando as primeiras unidades (com volante do lado direito) para Cingapura e negociando com os EUA um contrato draw back, para fornecimento do Targa com motor norte-americano e transmissão francesa. 559 unidade seriam produzidas até 1988, quando o Targa foi retirado de linha.

No último trimestre de 1983 a linha de modelos foi mais uma vez ampliada. Foram três novidades, todas elas tomando o Miura Targa como base: as versões teto rígido e teto solar (nas quais, apesar do nome, o carro deixava de ser um verdadeiro targa) e um conversível, chamado simplesmente Spider, com capota de acionamento manual confeccionada em seda de paraquedas com forração interior. O chassi tubular foi reforçado para manter a rigidez da carroceria aberta, porém as demais características mecânicas e os equipamentos internos da versão anterior foram mantidos. Targa e Spider receberam para-brisa com maior área e, nas laterais, uma elegante linha curva ascendente, dando um toque dinâmico à carroceria. Antes de terminar o ano, na 1ª Feira do Automóvel a Álcool, a empresa lançou mais um carro, um conversível de menor preço sobre plataforma Brasília e sem faróis retráteis, chamado Kabrio. Apesar de mais barato, não teve acolhida e foi retirado de linha meses depois.

Em 1984 Targa e Spider receberam alguns melhoramentos, dentre os quais retrovisores anti-ofuscantes, abertura elétrica do porta-malas e tampa de cobertura da capota, quando aberta, pintada da cor do carro; o vinco contínuo na lateral da carroceria foi eliminado. O novo motor VW 1.8 (do Gol GT, Passat Pointer e o recém-lançado Santana) passou a ser oferecido como opção; ao mesmo tempo, os modelos antigos com motor traseiro saíam de linha. Foi da Miura uma das principais atrações do XIII Salão do Automóvel, no final daquele ano: o ousado Saga, GT de quatro lugares com motor Santana 1.8, suspensão do Gol GT e avançados recursos tecnológicos, dentre eles telefone sem fio, abertura das portas por teclado (fixado externamente, na coluna esquerda) conectado ao alarme, computador de bordo com sete mensagens e sintetizador de voz, lembrando ao motorista a necessidade de apertar cintos, soltar o freio de mão, trancar as portas e abastecer.

Em 1985, buscando ampliar sua área de atuação, a Besson, Gobbi entra no mercado de buggies, lançando o Galgo; como já era tradição da empresa, o carrinho ganhou um desenho bastante original. O negócio, que duraria cinco anos, seria vendido em 1990. Graças à ágil política de lançamentos e permanente atualização dos modelos, a empresa terminou o ano como maior fabricante nacional de veículos fora-de-série, reconhecida pelo luxo e requinte de seus produtos, a ponto do Saga, um dos carros mais caros do país, ser seu modelo mais vendido.

Em 1986 o Saga chegou ao auge da sofisticação: além de ar condicionado, direção hidráulica, teto solar e todos recursos eletrônicos inseridos no modelo anterior, ganhou rádio com equalizador gráfico, célula fotoelétrica para o acendimento dos faróis, abertura das portas por controle remoto, TV no painel e bar refrigerado no banco traseiro. Para coroar tantas novidades a empresa preparou para o XIV Salão o Miura Saga 787, anunciado como a “evolução” do Saga. Cinco centímetros e meio mais curto do que este, foi apresentado na cor dourada, com interior monocromático em couro marrom claro. Equipado com turbocompressor, externamente o 787 se diferenciava pela terceira porta, sobre a qual foi montado um enorme aerofólio, e pelas luzes de posição em neon, situadas em duas faixas delgadas sobre os para-choques.

miura-texto7

Miura Targa 1984 (fonte: site pumaclubedobrasil).

A empresa manteve sua campanha de lançamentos continuados ao longo dos anos, trazendo sem interrupção versões cada vez mais requintadas, no limite do excesso. Em 1987, na V Brasil Transpo, apresentou o X8, com carroceria muito diferente dos modelos anteriores: nova frente, cobertura dos faróis com abertura para cima, para-brisa traseiro envolvente ao estilo do Chevrolet Corvette, tampa do porta-malas com aerofólio integrado, lanternas traseiras do Gol (invertidas), separadas por larga faixa refletiva com o nome Miura em grandes letras. No interior, bancos com regulagem elétrica e retrovisores com sensor de luminosidade e escurecimento automático para evitar ofuscamento. No ano seguinte adotou o motor AP de dois litros do Santana, o que exigiu alguns ajustes no chassi, suspensão e compartimento do motor.

No XV Salão, em novembro, foi lançado o chamado Saga II, versão atualizada do Saga absorvendo todas as novidades até então introduzidas na linha. Além de adotar um discreto aerofólio sobre a tampa da mala o carro mudou drasticamente no visual da capota, onde para-brisa e vidros traseiros foram montados em seqüência, sobrepondo-se às colunas, dando a impressão de peça única – solução a um só tempo ousada e elegante. Na feira Brasil Transpo de 1989 foi a vez do Top Sport, um pouco mais largo e arredondado e com as laterais levemente curvas e faixas de neon percorrendo toda a largura do carro, na frente e atrás.

Finalmente, em 1990, no XVI Salão do Automóvel, foi apresentado o X11 (oficialmente lançado em junho seguinte), concebido como opção mais leve do X8, com maior área de entrada de ar para o motor e grande aerofólio traseiro, inicialmente sem ar condicionado e alguns outros acessórios, de modo a obter melhor desempenho esportivo. A versão comercializada, contudo, dispensou a simplicidade e trouxe sofisticação em acabamento e tecnologia, incluindo alguns itens inéditos no país. Vinha equipado com motor VW AP-2000, suspensão do Santana com amortecedores eletrônicos com três diferentes calibrações, freios a disco nas quatro rodas e direção hidráulica. Internamente, ar-condicionado, teto solar, revestimento de couro, “trio elétrico”, bancos e coluna de direção com ajuste elétrico, abertura das portas com chave presencial, computador de bordo com sintetizador de voz e televisão no painel. Naquele ano a empresa também passou a oferecer para todos os modelos, como opção, ABS (pela primeira vez no Brasil), injeção eletrônica (do Gol GTi), piloto automático e amortecedores reguláveis – os quatro, itens de série no X11.

A liberação das importações decidida pelo governo Collor, fatal para a maioria dos pequenos fabricantes de veículos, também teve forte impacto negativo sobre a Besson, Gobbi. A empresa procurou reagir prontamente à ameaça lançando campanha publicitária nacional, em meados de 1991, mostrando as vantagens – inclusive em preço – dos seus carros ultra-equipados frente aos importados. Hipnotizado pelo fetiche do automóvel estrangeiro, no entanto, o mercado não respondeu aos seus apelos, obrigando à redução da produção da média mensal histórica de 35 unidades, nos últimos anos, para somente cinco por mês em 1992. Determinada a não acumular prejuízos a empresa encerrou a produção naquele mesmo ano, após terem sido fabricados (estima-se) cerca de 3.500 carros.

A Besson, Gobbi, porém, não se afastou do setor: ao invés disto, não só obteve a representação local dos jipes Niva e automóveis Subaru, como também se preparou para retornar como fabricante. Assim, ainda em 1992 a empresa entrou no mercado de transformações, lançando em setembro a cabine dupla BG Truck, construída em quatro versões a partir da picape Chevrolet D-20. Era seu objetivo continuar oferecendo produtos diferenciados, por isso equipou-a com diversos itens sofisticados, vindos do Miura, tais como abertura remota das portas e porta-malas, elevação automática dos vidros, piloto automático, ar condicionado, bar e rádio-CD. As picapes recebiam grade e para-choques novos, arremates nos para-lamas e tampão marítimo. Em 1995 foi apresentada opção com rodado duplo e alargadores nos para-lamas traseiros.

Não satisfeita, no ano seguinte projetou novo modelo, com carroceria de quatro portas totalmente de fibra de vidro, assoalho (rebaixado) e porta-malas fechado integrados ao conjunto. A carroceria tinha estrutura tubular e era apoiada sobre coxins de borracha. Portas e para-brisa dianteiro vinham da Chevrolet, mas os demais componentes eram de fabricação própria ou oriundos de automóveis de grande série. Acabamento interno e externo eram muito bem cuidados e, já na versão básica, o carro vinha equipado com aquecimento, ar condicionado, vidros verdes elétricos, forração em veludo e travamento central das portas. As picapes BG foram produzidas por quatro ou cinco anos, quando a Besson, Gobbi por fim cessou suas atividades como fabricante de veículos.





GmailFacebookTwitter